Na Dois Pontos de julho falámos às crianças sobre a felicidade. Dissemos-lhes que ser feliz não depende de coisas materiais nem de conquistas e medalhas, mas sim da capacidade de focarmos a nossa atenção em todos os motivos que já temos para nos sentirmos bem. A felicidade depende da forma como olhamos para nós mesmos e para o mundo à nossa volta.

 

O que é ser feliz?

Felicidade: conjunto de circunstâncias que causam ventura; estado da pessoa feliz; tendência para acontecimentos positivos ou favoráveis. A versão do dicionário sobre o que é a felicidade pode ficar aquém do que esta simboliza na vida de cada ser humano. Para a maioria de nós, simboliza uma busca: por dinheiro, uma carreira de sucesso, um relacionamento amoroso, uma família harmoniosa, a compra de uma casa. Estão são, entre tantas outras, as medidas da felicidade. E quando conquistamos uma, queremos logo outra a seguir.

 

Desejar é condição do ser humano, é o que nos faz expandir, evoluir e criar. Mas desejar pode ser um obstáculo à felicidade quando a fazemos depender do objeto do nosso desejo, ignorando tudo o resto. No caso da Leonor (ver artigo da Dois Pontos n.º 7), a felicidade era uma bicicleta cor-de-rosa. É bom desejar quando desejar nos impulsiona e acrescenta, não quando nos subtrai, não quando, aos nossos olhos, somos menos porque temos menos.

 

A felicidade, por mais subjetiva que seja, é uma questão de ser. Ser quem somos, como somos. A felicidade pode ser definida como uma sensação de bem-estar e contentamento com aquilo que É, aceitando-nos e aceitando a realidade à nossa volta. Tal não impede que estabeleçamos novos objetivos para nós mesmos, ou que queiramos mudar. Podemos desejar que as coisas sejam diferentes do que são e, ainda assim, aceitar o ponto onde nos encontramos no momento. Aceitar significa abstermo-nos de lutar contra a realidade que se apresenta, mantendo a nossa força criativa e a confiança de que nos podemos transformar.

 

Na busca pela felicidade, é importante relembrar que não existem situações perfeitas, mas existe sempre a possibilidade de construir um estado novo de ser. Basta querer. A mudança de pensamentos e, consequentemente, de emoções e de comportamentos, é um caminho fundamental rumo à tão almejada felicidade. Porque a felicidade é um caminho e não um objetivo, implica crescer, experimentar e viver. Felicidade é questão de ser e, a partir daí, podemos rumar às outras premissas que constituem o triângulo da felicidade: ser – fazer – ter.

 

Como ser feliz?

Na nossa sociedade, não ensinamos às crianças como podem ser felizes. Nem as ensinamos a preservar a alegria que lhes é tão característica, nem a leveza com que vivem o dia a dia. «Eu quero ser feliz» é uma afirmação que está na boca do mundo, mas não usamos o nosso tempo a desbravar caminho em direção à felicidade. Assumimos, e passamos essas ideias às nossas crianças, que felicidade é ter coisas e conquistar coisas e ser bom a fazer coisas. E a felicidade é ser o quê?

 

Ser feliz é uma questão de atenção. Direção e foco. E hábito de pensamento. Ser feliz é mais um hábito do que uma conquista. Viver cada dia de forma feliz é procurar todas as razões, motivos e acontecimentos maravilhosos que permitem que o nosso «copinho da felicidade» se mantenha cheio. Ser feliz significa ter a capacidade de celebrar as pequenas conquistas do nosso dia a dia. E significa também agradecer.

Há um ditado que diz: «Tive muitos problemas na vida, poucos se concretizaram.» Ouvimo-lo da boca de um pai. Se pudermos passar às nossas crianças esta sabedoria, iremos poupar-lhes muitos problemas.

Os adultos podem ajudar as crianças a construir hábitos que promovam a sensação de bem-estar e um olhar positivo perante elas próprios e perante a vida. Podem, por exemplo, ajudá-las a fazer uma breve reflexão sobre o que aconteceu de bom durante o dia e as formas como se superaram, mesmo nos momentos de desafio. Podem ajudá-las a distinguir problemas reais, que estão a acontecer no imediato e que precisam de ser solucionados, de medos e preocupações que existem apenas dentro das suas cabeças.

 

Quando falamos de felicidade, precisamos também de falar de equanimidade. No dicionário, equanimidade significa «igualdade constante de ânimo ou de temperamento em qualquer conjuntura da vida». A verdade é que coisas indesejadas acontecem, não as podemos prevenir. Também é verdade que a vida está em permanente mudança e que muitas das coisas que parecem afetar-nos tanto num dia, daí a dois dias já foram esquecidas. Ser feliz é saber navegar nos altos e baixos da vida, mantendo um estado de ânimo constante e equilibrado, não nos deixando elevar-nos às alturas nem afundar-nos no abismo.

 

Eu sou feliz? O que me faria feliz?

Aqui está um breve exercício que pode fazer, a sós ou com a sua criança: se pudesse escolher 3 momentos da sua vida em que se sentiu feliz, quais escolheria? E porquê? Porque é que se sentiu feliz nesse momento? O que estava a acontecer? Que necessidades suas estavam a ser preenchidas? E de que forma pode resgatar esses momentos e trazê-los para o momento presente? E recriar novos momentos?

 

Livro que os adultos podem ler para ajudar as crianças a ser felizes:

  • O Tao do Pooh, de Benjamin Hoff, Sinais de Fogo Publicações.

 

Inês Martins é psicóloga clínica e desenvolve a secção Emoções na revista Dois Pontos.